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Promoção da Iberdrola na COP26
Joana Ramiro
Joana Ramiro

Do lobbying ao greenwashing, o lado podre da COP26 teve pouco de discreto

Pela primeira vez na história da cimeira das Nações Unidas sobre as alterações climáticas houve um pavilhão exclusivamente dedicado ao sector privado. Mas o marketing ambientalista não se cingiu à Zona Verde e esteve sempre bem presente nos corredores da COP26 e nos pubs de Glasgow.  

12 Novembro 2021
Joana Ramiro

No final do anos 1970 a gigante petrolífera Exxon abriu um centro de pesquisa sobre o dióxido de carbono e os seus efeitos no meio ambiente. Até meados dos anos 1980 a empresa dedicou um milhão de dólares por ano ao centro de pesquisa. O homem que dirigia o projeto, Edward David Jr., acreditava piamente que em poucos anos a indústria se afastaria da "dependência de combustíveis fósseis e em direção a uma mistura de recursos renováveis que não representem os problemas de acumulação de CO2". Mas em menos de uma década o centro de pesquisa foi encerrado.

Não será talvez o exemplo mais flagrante de greenwashing – o projeto da Exxon não foi amplamente divulgado, nem pretendia retratar a petrolífera como amiga do ambiente. Demonstra sim, que o sector privado há muito que tem consciência da sua responsabilidade no que toca às alterações climáticas. Demonstra também como, se entregue somente a si própria, a iniciativa privada pouco fará que não tenha por incentivo uma maior margem de lucro.

Em 2021 o panorama não é assim tão diferente. O consumidor está mais informado sobre os danos que a extração de combustíveis fósseis causa ao planeta, e os efeitos das alterações climáticas são sentidos já por todo o mundo e não só em remotas ilhas do Pacífico. Mas para a indústria energética o lema parece ser 'business as usual'. Segundo dados das Nações Unidas analisados pela ONG Global Witness, pelo menos 503 representantes de companhias de gás e petróleo estiveram presentes na COP26. Fora o lóbi dos combustíveis fósseis uma delegação nacional e seria a maior presença na cimeira climática.

Pior: 27 delegações nacionais trouxeram consigo lobistas dos combustíveis fósseis. Entre elas está Angola, que registou seis empresários da Sonangol, e o Brasil que levou pelo menos duas pessoas da Petrobrás. Dados verdadeiramente chocantes quando nos deparamos com o mais recente relatório apresentado pela campanha Glasgow Agreement, que com base em dados que lhes foram facultados secretamente, expôs os 800 novos furos de gás e petróleo a serem inaugurados até ao fim de 2022. Entre eles estão, está claro, nove furos explorados pela Petrobrás e até três pela Sonangol. No entanto, ainda em maio deste ano, o governo angolano prometia reduzir em 14% as suas emissões de gases com efeitos de estufa. E logo ao início da COP26, o Brasil prometeu uma diminuição de 30% nas suas emissões até 2030.

A exploração destes novos furos "significaria um aumento inequívoco das emissões", disse João Camargo, do coletivo Climáximo ao Setenta e Quatro. A Climáximo é uma das 200 organizações que fazem parte da Glasgow Agreement e foi João Camargo quem apresentou o relatório durante a Cimeira dos Povos.

#drillbabydrill 816 new oil & gas wells planned in 76 countries until the end of 2022. Australia and Russia top the list, closely followed by Mexico. The other top drillers are these: https://t.co/toZ37tKQM9 pic.twitter.com/GpLc7pLtet

— Glasgow Agreement (@GlasgowAgreeme2) November 8, 2021

Os governos que fazem promessas em Glasgow, diz o ativista climático, são também os países que permitem a construção dos novos furos. "Todas (as explorações) exigem decisões políticas", acrescenta. O resto é hipocrisia. "Tudo o que acontece na COP é uma farsa, é um show," adianta João Camargo. "As instituições (da COP) têm embutido em si um mecanismo para falhar. A solução para o problema está muito longe dos limites destas instituições."

COP26

A Zona Verde e as outras zonas

E não é só na zona oficial da COP26, também denominada por Zona Azul, que os lóbis se manifestam. Na Zona Verde, um complexo oficial organizado ao lado da cimeira, exibem-se vários empreendimentos amigos do ambiente iniciados pelo sector privado. Albergada pelo museu da ciência de Glasgow, a Zona Verde passa quase por um legítimo exercício de promoção do conhecimento.

Lado a lado com as maquetes e jogos a exemplificar fenómenos científicos, aparecem as gigantes Unilever, Microsoft e a farmacêutica GSK. Visitantes podem entrar num protótipo de um carro da Hitachi, testar um carro de corrida eléctrico por simulador, e apreciar um modelo à escala de submarino de carga que alegadamente limpa os oceanos enquanto navega. A companhia energética espanhola Iberdrola, que também opera em Portugal, tem uma presença incontornável no pavilhão principal por deter a maior fonte de energia escocesa, a Scottish Power.

Mas a presença de greenwashing na COP26 é talvez mais discreta e funesta do que o circo que é a Zona Verde. Por toda a Glasgow há eventos paralelos, organizados por várias industrias, para alegadamente promover a transição verde nas mesmas. Numa função lúdica da plataforma informativa Devex está um jovem do departamento de sustentabilidade da gigante de auditoria PwC. Parece um peixe fora de água, um consultor num evento para profissionais na área do desenvolvimento e do sector humanitário.

Mas uma breve pesquisa desvenda que a PwC organizou uma série de sessões em redor da COP, em que logo a primeira discute como a consultora gere um recente concurso público do departamento britânico de apoio ao desenvolvimento. O concurso procura encontrar e promover projetos com infraestruturas sustentáveis que mobilizem capital institucional investindo-o em mercados emergentes.

O projeto e o interesse da PwC no tema ecoam a nova moda no mundo da banca: o conceito de ESG (environmental, social and corporate governance). Os princípios de ESG visam medir o impacto ambiental, social e interno das políticas de cada empresa ou dos seus investimentos. A moda pegou, com todas as grandes entidades no mundo financeiro a desenvolverem programas de investimento sustentável.

Em alguns casos esta preocupação com a responsabilidade do sector financeiro tem levado a mudanças salutares, nomeadamente no escrutínio de títulos e índices de investimento, em particular aqueles comprados por coletivos como pensões e sindicatos. Mas muitos dentro da própria indústria se perguntam até que ponto a iniciativa não passa de greenwashing ou é em última análise ultrapassada pela primazia do aumento de produtividade e margem de lucro.

Para melhor ou pior, a banca marcou presença na COP26 para além dos discursos oficiais e das promessas de 1.3 triliões de dólares em ativos dedicados ao erradicar das emissões de CO2.  Não serão no entanto boas notícias para as comunidades mais afetadas pelas alterações climáticas que as ONGs e organizações de ajuda humanitária com quem trabalham andem a brindar em pubs escoceses com pessoal de consultoras que ainda há pouco tempo aconselhavam a indústria petrolífera a cativar mais investidores. 

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