A urbanização do último pinhal na frente costeira de Cascais está pronta para avançar. A comunidade protesta há mais de 20 anos contra um projeto que vai reduzir de 52 para oito hectares o espaço natural junto à praia de Carcavelos, sem ponderar os fenómenos projetados pelas alterações climáticas.
António Abreu, biólogo de longa data, não se lembra dos nomes dos grandes jogadores que pisaram o espaço livre entre Carcavelos e o mar. Mas sabe que foi nesse mesmo local que o país descobriu, pelos “pés” dos ingleses, o futebol, e, pelas “mãos” dos mesmos britânicos, o críquete, o râguebi e o ténis.
Este lugar verde chama-se Quinta Nova de Santo António, mas é por Quinta dos Ingleses que é conhecido. E não é por estar associada ao críquete, ao râguebi ou ao futebol, mas pela chegada a Portugal, nos séculos XIX e XX, dos funcionários britânicos da companhia de cabos submarinos Falmouth Gibraltar and Malta Telegraph.
Situado junto a 1,5 quilómetros da praia de Carcavelos, no concelho de Cascais, a poucos metros da orla marítima, este foi um dos poucos locais a resistir aos projetos de urbanização da zona. Até agora. Desde 5 de julho de 2022, com a aprovação da alteração do Plano Diretor Municipal (PDM) de Cascais e depois do aval para os trabalhos na Quinta dos Ingleses se iniciarem, o projeto poderá começar em setembro deste ano.
Dependemos de quem nos lê. Contribui aqui.
“Vai arrasar o pinhal e descaracterizar toda a costa do Estoril”, lamenta ao Setenta e Quatro António Abreu sobre este espaço verde com cerca de 52 hectares de pinhal centenário e edifícios antigos devolutos.
Os terrenos que desde a década de 1920 deram "origem a um dos maiores parques naturais da linha do Estoril", conta o biólogo, são o refúgio para quem reside na área. Mas este lugar de biodiversidade representa uma luta da comunidade de Carcavelos com 60 anos de resistência a uma “megaurbanização”, desejada pelos seus proprietários e pela autarquia, que agora se vai transformar numa zona de construção de habitação e comércio.
Em 2009, a Quinta Nova de Santo António foi classificada como Imóvel de Interesse Municipal, por decisão municipal, e foi nesse sentido que o Plano de Pormenor do Espaço de Reestruturação Urbanística de Carcavelos-Sul (PPERUCS) surgiu, tendo como promotores a empresa Alves Ribeiro e a Saint Julian’s School Association, do privado colégio britânico.
Tudo mudou quando, em 2014, este mesmo plano foi aprovado, dando forma a um projeto de loteamento que prevê a construção de 850 apartamentos em edifícios de sete a nove andares, hotéis e uma zona comercial. A Câmara Municipal de Cascais deu luz verde para o desmatamento em grande escala da Quinta dos Ingleses.
Para Carlos Carreiras, atual presidente da Câmara Municipal de Cascais, é importante dar “nome às coisas”. “Este plano é uma bomba-relógio. Se for executado pela Alves Ribeiro é péssimo, se não for executado, temos de alocar quase três orçamentos municipais a indemnizações e ainda corremos o risco de, cumulativamente, ver repostos os índices construtivos de 1982”, afirmou em entrevistas anteriores.
De forma a justificar a tomada de decisão, insiste que o executivo camarário a que pertence foi o “que mais investiu em zonas verdes e que mais tem feito por colocar a sustentabilidade no topo da agenda política”.
A comunidade que ali vive não concorda com estas considerações. O movimento cívico SOS Quinta dos Ingleses organizou, a 5 de junho de 2021, um cordão humano desde a entrada da Quinta dos Ingleses, passando pela Avenida Jorge V, até ao muro que ladeia a estrada marginal. Pedro Jordão e Verónica Santos, membros desta iniciativa, contam ao Setenta e Quatro que o número de pessoas ultrapassou as expectativas. A ação veio na sequência de uma consulta pública criada em abril do mesmo ano pela autarquia de Cascais. “Temos conhecimento que teve mais de nove mil assinaturas, foi a maior de sempre em Portugal, mas os dados ainda não foram divulgados pela câmara”, diz Pedro Jordão.
Enquanto percorremos a Quinta dos Ingleses, António Abreu faz uma viagem pela história daquela que foi a estação de cabos submarinos de Carcavelos do tempo modernista e da importância que este espaço tem na sua localização geográfica. Trazia consigo Memórias da Linha de Cascais, um livro das autoras Branca Colaço e Maria Archer. Não que precisasse de recorrer a ele, “mas são muitos anos de história” e não quer que a memória lhe falhe.
Este foi um “dos raríssimos casos de sobrevivência de um espaço por elas descrito”, diz-nos enquanto aponta para o livro. Preocupado e poupando “grandes cenários”, refere que “este projeto vai colocar em risco a praia de Carcavelos, para não falar do quão severamente o comércio local será afetado”.
O biólogo acompanhou o desenvolvimento da fauna e flora da Quinta dos Ingleses no final da década de 1990. Conhecedor deste lugar como poucos, explica que nos anos 1930 o antigo palacete dos morgados de Alagoa, família que fundou esta quinta e onde se produzia o vinho de Carcavelos, foi convertido na sede do colégio inglês Saint Julian, que ainda hoje lá se encontra.
"Olhando para este espaço com uma dimensão equivalente a 17 Praças de Comércio, vão sobrar duas Praças de área verde", afirma Pedro Jordão.
Com o intuito de preservar este espaço e fazer frente à autarquia, António Abreu acompanhou o protesto da associação Fórum por Carcavelos no início dos anos 2000, pois "já se falava de uma tentativa de urbanização que levaria a 15 anos de construção'', explica.
Naquela altura, tudo se cingia à violação do PDM. Neste caso eram as cérceas dominantes – a altura e comprimento de edifícios – que não estavam a ser respeitadas. Nas zonas urbanas, “as alturas máximas de fachadas eram de 16 metros. Ora, o Plano de Pormenor [documento municipal que acompanha sempre construções de grandes dimensões] indicava que a ‘cércea dominante’ da proposta seria de 17,6 metros”, indica.
Este cenário foi o suficiente para impedir o avanço da construção por não cumprimento do PDM, mas esta não foi a única ‘prova de esforço’ pela qual a comunidade local passou. E muito menos a primeira.
Desde o envio de um processo ao Instituto Português do Património Arquitetónico (IPPAR) solicitando a classificação integral da Quinta dos Ingleses, no final dos anos 1980, à primeira petição subscrita em 1990 por mais de quatro mil pessoas pedindo que “este importante património ambiental e edificado fosse preservado e requalificado”, a comunidade não baixou os braços às tentativas de demolição deste local, levando à sua sobrevivência nas últimas décadas.
Enquanto representante do movimento SOS Quinta dos Ingleses, Pedro Jordão explica a proporção do problema: "Olhando para este espaço com uma dimensão equivalente a 17 Praças de Comércio, vão sobrar duas praças de área verde, incluindo canteiros.”
Se este projeto avançar, o parque urbano vai ser reduzido de 52 para oito hectares, onde centenas de árvores serão derrubadas. Esta zona verde vai apenas contemplar campos relvados de jogos, canteiros, uma ribeira já existente e uma pequena área de pinhal que se encontra do outro lado da estrada, junto à Quinta de São Gonçalo, a este da Quinta dos Ingleses.
Em 2014, a aprovação do PPERUCS levantou um cenário duvidoso. O plano foi aprovado em assembleia municipal com o voto de Zilda Costa Silva, à época presidente da Junta de Freguesia de Carcavelos e Parede. A representante do PSD não terá tido em conta três documentos “de pronúncia desfavorável”, aprovados pela mesma assembleia em fevereiro e no final de abril desse ano e, dessa forma, este ato valeu a Zilda Costa Silva uma moção de censura assinada pela assembleia municipal.
"Não tivera a presidente da junta de freguesia usurpado o poder deliberativo e abusado do seu poder de representação, o PPERUCS teria sido chumbado em assembleia municipal", lê-se na moção aprovada com dez votos a favor de todos os partidos da oposição e nove contra da lista da coligação que na altura governava Cascais (PSD/CDS).
Pedro Jordão reconhece que "é um absoluto contrassenso que a câmara apoie conferências que falem sobre as alterações climáticas e, no entanto, promova este ecocídio”
É também a partir da aprovação deste plano que os atuais representantes camarários Carlos Carreira e Miguel Pinto Luz, vice-presidente da Câmara de Cascais, destacam o valor da indemnização que a autarquia terá de pagar caso recue na construção do projeto. “Fala-se de uma indemnização de cerca de 300 milhões de euros e não será a câmara responsável por este valor”, afirmam. Questionados sobre possíveis soluções, só identificam uma: “Se o parlamento cumprir a sua parte e criar um instrumento jurídico que permita ao Governo travar o processo entre os promotores privados, não nos iremos opor".
Usando um argumento a que a maioria do executivo camarário tem recorrido nos últimos anos, estas afirmações nada dizem aos moradores que se recusam a transformar a Quinta dos Ingleses “em betão”. Depois de várias ações de intervenção do movimento SOS Quinta dos Ingleses, o representante do movimento (que é também advogado) afirma que esta “é uma falácia sem qualquer fundamento legal".
O membro da associação reforça ainda que o valor que a autarquia estipulou como necessário para pagar aos proprietários a cedência do espaço ou a sua expropriação nunca foi estabelecido em tribunal. Para não falar da “variação dos valores que têm sido apresentados pelo presidente, em particular no último ano”, concluiu em comunicado.
O movimento cívico SOS Quinta dos Ingleses lançou, em 2018, uma petição que reuniu mais de sete mil assinaturas e que foi entregue e discutida na Comissão de Ambiente da Assembleia da República. No entanto, no relatório elaborado, os deputados desta comissão acabaram por considerar que o parlamento não teria “competência para se pronunciar'' quanto à revogação do PPERUCS, remetendo responsabilidades para a autarquia de Cascais.
Dois anos depois, a 5 de maio, a SOS Quinta dos Ingleses reuniu-se novamente numa Comissão Parlamentar para o Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, depois de requerimentos feitos pelo PAN, PS e PCP.
Dividida em duas audições virtuais estiveram presentes, juntamente com o movimento Fórum por Carcavelos, o atual presidente da câmara, Carlos Carreiras, e os representantes do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) e da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT).
As duras críticas deixadas ao projeto PPERUCS voltaram. “Não há neste projeto a mínima, a pálida sombra de interesse público. É exclusivamente privado”, afirmou o representante da SOS Quinta dos Ingleses na sessão, que levou os deputados e o movimento a concordar.
O representante da SOS Quinta dos Ingleses considera este ato como " um caso de falta de vontade política”.
A destruição de uma área verde bastante significativa poder conduzir à ocorrência de fenómenos extremos de precipitação e de subida das águas do mar foi um argumento reforçado por Pedro Jordão na sessão.
Na época em que participou no Plano de Ordenamento da Orla Costeira de Alcobaça ao Cabo Espichel, o geógrafo Sérgio Barroso teve um contacto mais próximo com a possível concretização deste projeto. Recorda que existiram pressões da câmara: “Era um espaço natural e devia ficar consagrado no programa nestes termos, mas a câmara não queria. Houve várias pressões, não sobre mim que era o coordenador do programa, mas sobre a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e até do promotor do empreendimento”.
A tomada de posição que desaconselhava a edificação naquela área tornava-se, assim, “um incómodo” para a câmara. “Era mais uma preocupação para eles do que para o promotor imobiliário, na medida em que ela ficava impedida de construir”, completa.
Por sua vez, tanto o ICNF como a CCDR-LVT apontaram para a legalidade da intervenção, escusando-se a qualquer competência para impedir a concretização do projeto. Do lado do ICNF, Rui Pombo, diretor regional de Lisboa e Vale do Tejo desta entidade, explicou que "o projeto não incide sobre nenhuma área classificada ou protegida, não está sob o regime florestal, nem põe em risco nenhuma espécie protegida". Ainda assim, estes argumentos não coincidem com os dados e alertas divulgados pelo Regulamento Municipal de Cascais de Espaços Verdes e de Protecção da Árvore.
No documento lê-se que, no que respeita à flora, foi identificado um total de 298 espécies arbóreas e apesar destas espécies estarem sujeitas a regime especial de proteção serão abatidas em grande escala.
Outro aspeto que se mostra contraditório é a Declaração de Impacte Ambiental ‘Favorável Condicionada’. No documento, revisto em 2021, não se coloca em evidência o índice de impermeabilização do solo, que atinge os 70%. Ora, este valor contraria as orientações de gestão do território determinadas no Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROT-AML), concentrado na zona Algés-Cascais.
Diretamente do seu gabinete, através do zoom, para a sala de reuniões da Câmara Municipal de Cascais, Paula Pinto, chefe de divisão da CCDR-LVT, apontava em que entidade não podia “bloquear um procedimento porque alguém não gosta dele". Para si, o plano não apresentava qualquer incumprimento e ao longo do processo salientava que se procurava "minimizar qualquer constrangimento”.
Ainda assim, a chefe de divisão da CCDR-LVT não recusava que o plano tinha de ser alvo de reconfigurações, principalmente no que toca às questões relacionadas com as alterações climáticas, isto porque pode vir a violar as atuais normas legais. “Eu gostaria só de recordar que nós estávamos em 2011. Estamos em 2021. O plano pode-se alterar para se reconfigurar a todos estes instrumentos científicos e legais que existem hoje e que não existiam na época”, afirmou.
"A praia de Carcavelos poderá criar uma baía e, por sua vez, criar um recuo natural que coloque em causa a principal via rodoviária da zona”, alerta o geógrafo Sérgio Barroso.
Tanto as alterações a que a representante da CCDR-LVT se refere como a inviabilização do projeto apenas poderão ser feitas pelo município, porque é um plano municipal. “A CCDR não pode chegar ao plano e dizer agora têm de se adaptar ao plano das alterações climáticas. Há uma consolidação de um direito aqui representada”, termina na sua intervenção.
As afirmações que Paula Pinto fez na sessão virtual da comissão trouxeram consigo um lembrete antecipado. A 19 de julho do mesmo ano, a Assembleia da República publicou uma resolução que classificou a Quinta dos Ingleses como uma “Paisagem protegida de âmbito local”. É no seguimento desta resolução que João Matos Fernandes, ex-ministro do Ambiente, escreveu um ofício ao presidente da Câmara Municipal de Cascais onde afirmava que é da responsabilidade do executivo camarário “averiguar as expectativas de aproveitamento urbanístico e de eventual indemnização que possa existir”.
No mesmo documento, o antigo ministro escreve que a resolução do Governo recomenda a salvaguarda e a valorização ambiental e patrimonial da Quinta dos Ingleses. Os terrenos passariam a ser uma área protegida de âmbito local se a Câmara de Cascais assim o determinar.
"Ao artificializarmos aquela área e estamos a fazer com que a penetração do ar marítimo fresco não chegue a diversas áreas", continua o geógrafo e urbanista.
É ainda mencionado que dependerá também desta instituição os meios para travar, ou não, o processo partindo da lei. O município passa assim a ter todos os instrumentos para atuar se assim o quiser. As soluções passam pela “via de expropriação por utilidade pública” à “via de alteração do regime PPERUCS, como consequente alteração da licença de loteamento por iniciativa municipal, dependendo do valor da indemnização a pagar de uma análise rigorosa da consistência dos direitos de aproveitamento urbanístico alegados”, lê-se no ofício.
As medidas de cedência e de autonomia que a lei confere ao corpo camarário, citadas por João Matos Fernandes, não são suficientes. A câmara abdicará, assim, de uma área verde essencial para usufruto da população, a manutenção da própria praia e o arrefecimento do interior da povoação.
Apesar dos 52 hectares de pinhal serem atualmente um depósito de lixo, sem que seja efetuada qualquer limpeza por parte dos proprietários ou pela entidade Cascais Ambiente – que afirma ao Setenta e Quatro ser apenas responsável por limpezas na via pública – as ações de preservação do local têm sido feitas pela SOS Quinta dos Ingleses.
Para a câmara a solução que o PPERUCS estabelece para combater este tipo de situações é criar campos de jogos e manter o leito da ribeira, sendo as únicas zonas verdes que o projeto inclui e aquelas que se vão manter relativamente inalteradas.
Face a estas intenções, o movimento volta a colocar a tónica na importância de um jardim na área e a possibilidade da construção de um museu que “poderia ser um interesse adicional do enorme parque público”. “É manifestamente um caso de falta de vontade política, porque a câmara tem todos os poderes para reverter a situação”, afirma Pedro Jordão, numa conversa com o Setenta e Quatro dias depois de uma das faculdades da Universidade Nova de Lisboa, localizada em Cascais, receber conferências internacionais sobre a proteção dos oceanos financiadas e apoiadas pela câmara.
“É um absoluto contrassenso que façam conferências apoiadas pela câmara aqui ao lado a falar sobre a proteção dos oceanos, as alterações climáticas e a necessidade de combater o aquecimento, e essa mesma câmara é a promotora deste ecocídio”, afirma.
No edital da consulta pública sobre a qual ainda não se sabe o resultado, refere-se que 102 967.50 m2 do plano serão destinados a arruamentos, passeios, ciclovias e parque de estacionamento de acesso à praia e que “abaixo da cota da soleira, afetos a arrecadações, áreas técnicas e estacionamento, são previstos 245 098.00 m2”. Ou seja, áreas subterrâneas.
Quando este projeto foi inicialmente proposto, em 1960, o impacto das alterações climáticas não eram consideradas porque ainda não tinham sido suficientemente estudadas.
“Essa é a grande questão”, explica Sérgio Barroso. O geógrafo e urbanista refere que desde que foi criado o Plano de Ordenamento da Orla Costeira de Alcobaça ao Cabo Espichel (POC-ACE), as construções são restringidas num raio de 500 metros a contar da linha do mar. Até aos 1000 metros, as condicionantes para construção são várias e, neste caso, o geógrafo explica que há uma recomendação para que a grande construção não prossiga. “Através deste plano, determinamos que aquele território devia ficar consagrado numa faixa de proteção complementar, estando dentro dos critérios e parâmetros que tínhamos assumido para a sua preservação.” Se este projeto avançar, estará a ultrapassar uma recomendação de 2011 e a não respeitar um plano de ordenamento nacional.
Além da importância histórica e patrimonial, esta zona situa-se entre a bacia hidrográfica da Ribeiras das Marianas e da Ribeira de Sassoeiros, atravessada por esta última, que constitui um importante suporte ambiental e de lazer da comunidade local de Cascais. Fazem parte da estrutura verde de corredores ecológicos que se ligam com o Parque Natural de Sintra – Cascais. Nesta medida, o avanço do projeto pode não só levar a uma modificação total do espaço geográfico, como ainda ao desaparecimento da marginal a longo prazo.
“A Quinta dos Ingleses pode recuar e possivelmente retirar a marginal, ou seja, a praia de Carcavelos poderá criar uma baía e, por sua vez, criar um recuo natural que coloque em causa a principal via rodoviária da zona”, alerta o geógrafo.
Por outro lado, o corredor eólico que existe naquele pinhal e que é “extremamente importante”, com o aval desta construção, também será comprometido. “Terá implicações no funcionamento do ecossistema da praia, assim como na ventilação do espaço urbano”, continua Sérgio Barroso.
A alteração da temperatura da zona é também outra preocupação para a qual o urbanista alerta, pois a proximidade do mar tem um efeito de amenização térmica significativo. Este espaço natural “funciona como uma ilha de arrefecimento” para o interior do concelho. “Ao artificializarmos aquela área e obstaculizar um corredor de ventilação estamos a fazer com que a penetração do ar marítimo fresco não chegue a diversas áreas”, alerta.
Desta forma, o efeito de ventilação que existe para o interior do concelho será impedido e isso terá implicações negativas, especialmente em edifícios com grande volumetria, como é o caso das construções idealizadas no projeto.
Apesar de estar dividida entre o abandono e um antagonismo circular, a Quinta dos Ingleses é “especial” não só pela sua história e dimensão, mas também pela biodiversidade que acolhe.
A grande responsabilidade recai, agora, sobre a câmara em preservar os últimos redutos verdes que este território oferece, enquanto “espaço de desafogo” a que grande parte dos especialistas se atrevem a chamar de “único na frente de Cascais”.
Apoiar
o Setenta
e Quatro
O Setenta e Quatro precisa de leitoras e de leitores, de apoio financeiro, para continuar. Em troca damos tudo o que tivermos para dar. Acesso antecipado às edições semanais e às investigações, conversas e publicações exclusivas, partilha de ideias e muita boa disposição.