A punição coletiva do povo palestiniano é um crime israelita

A punição coletiva do povo palestiniano é um crime do Estado israelita

O Hamas é um movimento extremista islâmico nos antípodas de qualquer pessoa que defenda uma sociedade democrática e progressista. A população da Faixa de Gaza não deve ser coletivamente castigada pelas ações de uma organização.

O pânico do palestiniano Mkheimer Abusdada aumenta à medida que os bombardeamentos israelitas se aproximam e se tornam mais barulhentos. “O necessário é uma passagem segura, corredor humanitário”, disse ao Washington Post o analista político que vive em Gaza, defendendo uma trégua. “Conseguimos viver sem eletricidade, sem combustível, com pouca comida. Mas o mais importante neste momento é uma área segura.”

Há questões claras como água. O bloqueio total à Faixa de Gaza (considerada por muitos a maior prisão a céu aberto do mundo) imposto pelo governo de Benjamin Netanyahu, cortando comida, água, combustível e eletricidade, é um crime de guerra e um crime contra a humanidade.

O Hamas é um movimento extremista islâmico nos antípodas de qualquer pessoa que defenda uma sociedade democrática e progressista. As imagens que nos têm invadido os ecrãs sobre o ataque que fez a Israel e os milhares de mortos de ambos os lados são aterradores. A Faixa de Gaza, porém, não é o Hamas nem o Hamas é a Faixa de Gaza: é uma separação essencial para evitar o enraizar de um discurso de propaganda de guerra, desumanizador de todo um povo, que impede soluções diplomáticas. Nenhum povo deve ser coletivamente castigado pelas ações de uma organização.

A Faixa de Gaza é um enclave, cercado e ocupado por Israel desde 2007, com 10 quilómetros de comprimento e 41 de largura, uma área com o tamanho de São Pedro do Sul e com a população da Grande Lisboa. As condições em que vivem 2,3 milhões palestinianos – metade são crianças – neste enclave são assustadoras e desumanizantes: 80% da população vive na pobreza, 90% não tem acesso a água potável. Só este ano, até 7 de outubro, pelo menos 240 palestinianos foram mortos por tropas israelitas.

Até esta quarta-feira, seguindo o “conselho” de Netanyahu, que disse aos cidadãos de Gaza para fugirem, mais de 260 mil pessoas foram forçadas a abandonar as suas casas, segundo as Nações Unidas. No entanto, não têm para onde fugir: Erez, a única faixa pedestre na fronteira para Israel está fechada; Rafah, do lado da fronteira do Egito, tem sido constantemente bombardeada pela Força Aérea israelita. E sabem que, se saírem, nunca mais poderão regressar: ficarão condenadas a viver em campos de refugiados.

Vale ao mesmo tempo a pena prestar atenção e denunciar o discurso genocida do governo de Israel, que tem vindo gradualmente a anexar a Faixa Ocidental. “Estamos a combater animais”, justificou o ministro da Defesa, Yoav Gallant, ao anunciar o bloqueio total a Gaza. “Agiremos de acordo [com isso]”. Este é o governo mais extremista de direita na história de Israel, não nos esqueçamos disso. 

A ocupação israelita, que matou mais de um palestiniano por dia desde 2008, a fúria colonizadora dos colonatos e o contínuo e impune desrespeito de Israel pela lei internacional são os grandes culpados pelo crescimento do Hamas e por esta escalada de violência. Netanyahu usou o Hamas para enfraquecer a Fatah, braço político da Organização de Libertação da Palestina, e assim a Autoridade Palestiniana. O objetivo é claro: impedir a solução de dois Estados acordada em Oslo, na Noruega, em 1993. O Hamas é, na prática, o maior aliado de Netanyahu, e há que o denunciar.

E os palestinianos de Gaza são as maiores vítimas da estratégia do primeiro-ministro israelita. “Por detrás de tudo isto está a arrogância israelita: a ideia de que podemos fazer o que quisermos e nunca pagar o preço, ou sermos castigados por isso, que continuaremos imperturbáveis”, escreveu no Haaretz Gideon Levy, conhecido jornalista israelita crítico da ocupação. “Acontece que o obstáculo mais sofisticado e caro do mundo [um muro] pode ser superado com uma escavadora velha quando a motivação é grande.”

O que se passa na Palestina não é um conflito. Resume-se em três palavras: colonialismo, limpeza étnica e genocídio.

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