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O Estado de Israel abraçou a banalidade do mal

O governo de Benjamin Netanyahu está a conduzir negociações secretas com vários Estados para que acolham refugiados palestinianos. O paralelismo com o Plano Madagáscar, delineado pelo regime nazi para deslocar centenas de milhares de judeus europeus para a ilha africana de Madagáscar, não deixa de surgir. 

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11 Janeiro 2024

A máscara do Estado de Israel caiu finalmente e só os comentadores de sempre que circulam pelos nossos canais televisivos se recusam a constatar o óbvio: Israel está a praticar uma política genocida na Palestina para ficar com terras que não lhe pertencem. As declarações genocidas de ministros e deputados sucedem-se e, aos poucos, Israel deixa de ter vergonha em assumir os seus verdadeiros objetivos como política oficial.

Volto a frisar, pois nunca é demais, ainda que seja óbvio: os bombardeamentos e a ofensiva contra Gaza e a sua população civil nunca foram sobre o Hamas ou os reféns, mas sobre a conclusão de um projeto colonial sionista que se prolonga há décadas. Já foram assassinados por Israel mais de 21 mil palestinianos, milhares deles crianças. E os números sobem às centenas todos os dias. O silêncio não deixa de ser ensurdecedor.

Soube-se esta semana que o governo de Benjamin Netanyahu está a conduzir negociações secretas com vários Estados para que acolham refugiados palestinianos. “O nosso problema é [encontrar] países que estejam dispostos a absorver as pessoas de Gaza, mas estamos a trabalhar nisso”, disse Netanyahu numa reunião de fação do seu partido, o Likud. Um desses Estados, diz o The Times of Israel, é a República Democrática do Congo.

O país, um dos menos densamente povoados em África, tem 52,5% da sua população de 5,7 milhões abaixo da linha da pobreza (1,9 dólares por dia), quando há oito anos eram 39,1%. O país foi brutalmente atingido pela pandemia de covid-19 e pelas consequências alimentares da invasão da Ucrânia pela Rússia. Desde 1968 que o Programa Alimentar Mundial, das Nações Unidas, intervém no país e só em 2023 distribuiu 72,7 milhões de toneladas de alimentos.

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As primeiras declarações (desde 7 de outubro) sobre a deslocação forçada de palestinianos foram proferidas, como não é de surpreender, pelo ministro da Segurança, Itamar Ben Gvir, e pelo ministro das Finanças, Bezalel Smotrich. Netanyahu já disse várias vezes que as palavras destes dois extremistas de direita não representam o governo, mas a verdade é outra: eles lançam as ideias, sondam os estados de alma da opinião pública israelita e mundial e, se não houver repercussões negativas significativas, planos começam a ser delineados.

A guerra representa uma “oportunidade para concentrar esforços no encorajamento da migração dos residentes de Gaza”, disse Ben Gvir a jornalistas e a membros do seu partido de extrema-direita. “É uma solução correta, justa e humana”, acrescentou. “Não podemos retirar de qualquer território em que estejamos na Faixa de Gaza. Não só não excluo a possibilidade de colonização judaica na Faixa de Gaza, como considero que se trata de uma questão importante.”

As declarações sucedem-se: “O problema de Gaza não é apenas nosso”, disse Gila Gamliel, Ministro das Informações. “O mundo deveria apoiar a migração humanitária, porque é a única solução que eu conheço.” Mas a grande maioria do mundo não está do lado dos crimes cometidos por Israel: a Assembleia-Geral das Nações Unidas condenou Israel 14 vezes só em 2023. Mas Estados Unidos e Europa mantêm-se hipocritamente ao lado de Israel.

O paralelismo com o Plano Madagáscar, delineado em 1940 pelo regime nazi de Adolf Hitler para deslocar centenas de milhares de judeus europeus para a ilha africana de Madagáscar, não deixa de surgir. Os algozes nazis também o apresentaram como solução humanitária, como um “problema” de toda a Europa, mas bem sabemos quais eram os seus objetivos: exterminar todos os judeus, que viam como sub-humanos, tal como os líderes israelitas veem os palestinianos. E o responsável por esse plano foi nem mais nem menos que o carrasco nazi Adolf Eichmann. Israel abraçou a banalidade do mal quando em tempos a levou ao banco dos réus.

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