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Às tantas parece que o valor de uma vida é tanto menor quanto mais escura for a sua pele

É bastante inquietante a facilidade com que tanta gente hierarquiza violências e consegue ignorar, com uma leveza sinistra, os milhares de palestinianos mortos, presos, vítimas de tortura física e psicológica. Todas as vítimas civis são de lamentar, mas porque é que parece que anos e anos de milhares de vítimas palestinianas causa tão pouco lamento para algumas pessoas?

Crónica 74
12 Outubro 2023

Como é que se explica que tanta gente que demorou meio segundo a classificar, e bem, o que fez a Rússia à Ucrânia como invasão, mas décadas inteiras volvidas de colonialismo violentíssimo (passe o pleonasmo) não consegue dizer o mesmo sobre o que faz Israel à Palestina?

Antes de prosseguir, e para que fique bem claro, sim, o Hamas é um grupo terrorista causador de atrocidades que merecem a mais óbvia condenação. Posto isto, é claro que o Estado de Israel também é uma organização terrorista que tem levado a cabo um agonizante genocídio do povo palestiniano. É assim tão complicado de perceber? Não me parece. Parece-me, sim, que há uma escolha deliberada de muita gente em defender o invasor da Palestina, quando andou meses a defender o invadido pela Rússia.

É bastante inquietante a facilidade com que tanta gente hierarquiza violências e consegue ignorar, com uma leveza sinistra, os milhares de palestinianos mortos, presos, vítimas de tortura física e psicológica, completamente despojados de casa, sonhos e direitos básicos, enquanto elege Israel como a vítima a ser defendida enquanto país. Há um colono e um colonizado, há um invasor e um invadido, há quem viva em liberdade e com todos os direitos, há quem viva aprisionado e violentado todos – todos! – os dias desde há décadas. São factos, não são opiniões.

Todas as vítimas civis são de lamentar, mas porque é que parece que anos e anos de milhares e milhares de vítimas palestinianas causa tão pouco lamento para algumas pessoas?

Parece-me que há aqui latente um racismo sistémico, uns laivos de islamofobia, um certo ocidentalismo como cultura superior, que faz com que tanta gente olhe para os palestinianos como sub-humanos. Não faz mal que milhões vivam na maior prisão a céu aberto, que tenham cortes de energia, água e comida, que sejam enxotados das suas terras, tantas vezes para debaixo delas, porque é assim mesmo a vida deles, coitados. Mas em Israel há prédios bonitos, as pessoas bebem cocktails ao final do dia e abrem start-ups divertidas. São mais parecidos connosco, faz mais confusão que morram porque podia ser um de nós.

E isto é escabroso. Esta hierarquização do valor da vida consoante a cor da pele, a religião ou os costumes.

Parte disto, pode ser fruto do enviesamento de parte da comunicação social e de muitos comentadores que escolhem conscientemente o lado do opressor, que ignoram toda a violência de que a Palestina é alvo há décadas.

Mas não temos de ser assim. Podemos informar-nos em muitos sítios e perceber que só há um país a colonizar, Israel, e a tentar que desapareça do mapa, literalmente, a Palestina.

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