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Mamarrachos políticos

Luís Montenegro é mesmo um político com p pequeno. Alguém acredita que não repetirá a sórdida experiência dos Açores caso haja no parlamento uma maioria das direitas cada vez mais extremas?

Crónica 74
4 Janeiro 2024

Só num país de poderes públicos pervertidos pelo individualismo possessivo, por um mamonismo privatista, é que pode passar por reabilitação, com os generosos benefícios fiscais correspondentes, a construção de raiz de um mamarracho – mais de 800 m2, com seis andares e oitos casas de banho – a poucas dezenas de metros do mar. Tudo o que os ricos fazem é beneficiado, e não só fiscalmente, nesta forma de Estado com cada vez mais enviesamentos de classe.

Não é apenas a origem das muitas centenas de milhares de euros enterrados em Espinho a merecer há muito um escrutínio mais profundo por parte do jornalismo de investigação. Este, infelizmente, vai escasseando entre nós. São também os valores que se ocultam e revelam em tal mamarracho: a falta de regramento e de decoro, o exibicionismo deprimente, a emulação dos ainda mais ricos, o consumo conspícuo numa época de desigualdades pornográficas, a plutocracia – o governo dos ricos, pelos ricos e para os ricos.

Luís Montenegro é mesmo um político com p pequeno: advogado de contratos por ajuste direto em câmaras municipais do seu partido, de tal forma desqualificado que até Passos Coelho evitou que fosse para o Governo, usando-o apenas para a defesa medíocre, na Assembleia da República (AR), da injustiça social que se cavou com o Governo da troika. Incapaz de uma metáfora que não envolva o futebol, e da forma mais desinspirada possível, foi dos que aceitou bilhetes oferecidos pela Galp para ir ver a bola.

Sim, a palavra videirinho existe para este tipo de figura pública. Ainda recentemente, assinalou: “André Ventura pertenceu ao PSD e sempre tivemos uma relação muito cordial e amiga”. Alguém acredita que Montenegro não repetirá a sórdida experiência dos Açores no caso, esperemos que cada dia mais improvável, de haver na AR uma maioria das direitas cada vez mais extremas? Afinal de contas, é sabido que o setor imobiliário de luxo está muito bem representado no Chega.

Incapaz de entusiasmar quem quer que seja, recentemente um pequeno e medíocre conjunto de figuras públicas – de Margarida Rebelo Pinto a Fernando Santos, passando por Manuel Luís Goucha – declarou o seu apoio a Montenegro, reclamando a “complementaridade das iniciativas e ofertas pública, privada e social na provisão das necessidades coletivas, designadamente nos domínios da saúde, educação e habitação”. Em 2024, todos têm a obrigação de conhecer a novilíngua neoliberal: querem apenas que o Estado financie ainda mais a entrada do capital nestas áreas, mecanismo para um brutal aumento do poder de compra político por parte dos mais ricos, para a construção de mais mamarrachos políticos.

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