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Macron 2017 = Le Pen 2022?

Graças à política de Emmanuel Macron, é provável que uma candidata da extrema-direita obtenha a melhor votação de sempre em França. Confirma-se que o caminho para o inferno fascista é pavimentado pelas intenções sempre socialmente regressivas do extremo-centro euro-liberal. 

Crónica 74
14 Abril 2022

A fórmula que dá o título a esta crónica foi forjada, sob a forma de previsão, há cinco anos. Coloco prudentemente um ponto de interrogação. Realmente, não sabemos o que acontecerá na segunda volta das eleições presidenciais francesas, mas é provável que, graças à política de Emmanuel Macron, uma candidata da extrema-direita obtenha a melhor votação de sempre em França.

Numa economia sem pressão salarial, o que muito se deve à redução dos direitos laborais garantida por Macron, e com um aumento geopolítico de tantos custos de bens vitais, Marine Le Pen concentrou o seu eficaz discurso na proteção do erodido poder de compra. Proteção, controlo e soberania nacionais constituem um trio de qualquer campanha enraizada popularmente.

Felizmente, a extrema-direita não foi deixada sozinha neste terreno: Jean-Luc Mélenchon deu a este trio incontornável uma declinação ecossocialista e radicalmente democrática; por pouco mais de um ponto percentual não disputou a segunda volta. Apesar de ser crítico da política de Putin, Mélenchon foi apodado de “putinista” e equiparado a Le Pen, porque sempre denunciou duas lógicas, a expansionista da OTAN e a pós-democrática da UE. O extremo-centro tem de recorrer cada vez mais a truques gastos, em modo de amálgama, para defender os seus privilégios, perante a ruína dos seus partidos tradicionais.

Um PCF demasiadas vezes disposto a virar à direita, apoiando, por exemplo, a rendição do Syriza em 2015, bem como ecologistas de jardinagem, ou seja, de ambientalismo sem luta de classes, e um Partido Socialista morto pela integração europeia não compreenderam, ao contrário de uma parte do seu eleitorado, qual era o voto verdadeiramente útil. Um programa positivo de transformação igualitária da economia, agora com uma inovadora dimensão ecologista, servido por um tribuno republicano galvanizador, é o melhor antifascismo. Não se desiste.

Entretanto, julgando-se eleito, Macron acentuou o seu discurso socialmente regressivo, prometendo cortes nos direitos sociais, com a subida da idade de reforma, por exemplo, apostando ao mesmo tempo no reforço dos aparelhos securitário e militar. A sua queda nas sondagens coincidiu com a apresentação de um programa euro-liberal fiel à UE. Afinal de contas, foi na sua presidência que os mais ricos beneficiaram de uma reforma fiscal reconhecidamente regressiva, ao mesmo tempo que as classes populares eram sobrecarregadas com impostos igualmente regressivos sobre os combustíveis, a chamada fiscalidade verde, medidas que até pareceram desenhadas para dar mau nome a uma transição energética necessária e que só poderá ser justa. Macron respondeu à justa revolta popular à bala.

Cinco anos depois da sua eleição, confirma-se que o caminho para o inferno fascista é pavimentado pelas intenções sempre socialmente regressivas do extremo-centro euro-liberal.

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