O empreendimento de Verdelago, no Algarve, esteve preso muitos anos nos corredores da burocracia até chegar às mãos de Luís Filipe Vieira. O Grupo Doyen e um consórcio de submarinos alemão apareceram nos documentos do BES, a determinada altura, como potenciais investidores neste resort construído em cima da Praia Verde, em Altura, no concelho de Castro Marim.
Forçada a voltar ao Uruguai após duas décadas a viver em Portugal, a reputada arquiteta Gabriela Iglésias queria que a empresa de Luís Filipe Vieira lhe rescindisse o contrato e reembolsasse o dinheiro que lhe devia. O fim da sua estadia no país tornou-se um pesadelo.
“A resposta que me enviou o representante do fundo de investimento foi praticamente uma ameaça”, conta-nos a arquiteta, revoltada, referindo-se ao fundo Oxycapital, parceiro de Luís Filipe Vieira desde 2015 na construção deste empreendimento a escassos metros de distância da Praia Verde. “Se eu tornasse públicas todas as denúncias, teria que me ver com as consequências.”
Tinha dedicado quase 20 anos ao empreendimento Verdelago.
"Ninguém iria contra Luís Filipe Vieira. Eu ia gastar muito dinheiro com os bancos, com os empresários, com todos. Era impossível", disse Gabriela Iglésias.
A missiva com tom ameaçador fez Gabriela Iglésias desistir, depois de inúmeras tentativas de estabelecer contacto com os promotores. “Enviei cartas, em que reclamava, em 2015, uma reunião para que terminassem o meu contrato. Finalmente, fechei o estúdio em Portugal. Muito triste”, lamenta. “Todos, ou a maioria, dos componentes da Verdelago, Promovalor ou Inland são advogados e conhecem toda a gente. E ninguém iria contra Luís Filipe Vieira. Eu ia gastar muito dinheiro com os bancos, com os empresários, com todos. Era impossível.”
A construção deste resort é um sonho antigo de vários promotores, travado por sucessivos obstáculos burocráticos antes de passar para as mãos de Luís Filipe Vieira.
O terreno é nas Terras de Verdelago, em Altura, no concelho de Castro Marim, no sudoeste do país. Isolado e com pouco mais de 6 mil habitantes, a escassos quilómetros de Espanha, a salinicultura é a atividade mais pujante do concelho. Nos confins do Algarve, há anos que Castro Marim está sedento de investimento.
Gabriela Iglésias foi contratada por um empresário finlandês, o primeiro promotor, em 1992. “A primeira relação foi excelente”, conta-nos.
Este é também o ano em que a aprovação do Plano de Ordenamento do Território do Algarve (PROTAL) proíbe a construção do empreendimento no local.
“O senhor cometeu suicídio. Sei que tentou desenvolver o projeto e encontrou relações muito difíceis com a burocracia”, conta-nos a arquiteta, não querendo estabelecer uma relação direta entre o suicídio e as barreiras burocráticas que o empresário finlandês encontrou.
O empreendimento Verdelago acabou aprovado no dia 9 de setembro de 1995, nas vésperas da saída do Governo de Cavaco Silva. É reconhecido como um projeto de Interesse Público.
“Se, por um lado, o plano já colocava algumas condicionantes tendo em conta o nível de ocupação que já existia no litoral, [por outro] deixou uma janela aberta para que alguns projetos que fossem considerados exceção serem passíveis de serem aprovados e isso remeteria para uma decisão a nível governamental”, explica Luís Brás, membro da associação ambiental Almargem, que tem sido uma voz dissonante contra a construção deste projeto turístico.
“Acontece que Verdelago foi objeto de um despacho conjunto do Ministério do Ambiente e da Área do Turismo, em que esse projeto e outros dois – Vilamoura 21 e Vale do Lobo 3 – receberam essa exceção”, conclui Luís Brás.
Com este golpe de sorte, o Plano de Pormenor é aprovado em 1997 pela Assembleia Municipal de Castro Marim, mas ainda não foi desta que se viu luz ao fundo do túnel.
“O projeto estava aprovado, faltava aprovar o protocolo, porque, como é sabido, o projeto sendo estruturante implicava uma parcela do investimento que tinha que ser feita na área do PROTAL. Faltava acertar esses detalhes, quando assumi a câmara, em 1998”, conta-nos José Estevens, presidente da Câmara de Castro Marim entre 1998 e 2013, do PSD.
“Depois houve uma alteração do Governo e sucederam-se um conjunto de dificuldades”, explica Estevens.
O antigo presidente da câmara refere-se ao Plano de Pormenor aprovado pelo Conselho de Ministros, em 2001, que prende a autorização para construir o empreendimento a uma declaração de impacte ambiental favorável. “O projeto acabou por não ter desenvolvimento com os promotores originais e por ser adquirido e desenvolvido pela Verdelago [Sociedade Imobiliária], que foi adquirida pela Inland.”
A Inland era a mãe de um largo conjunto de empresas que Luís Filipe Vieira criou neste período para erguer o seu império imobiliário, que absorveu a Verdelago - Sociedade Imobiliária em 2002. “Um dia, recebo uma chamada de Almerindo Duarte a dizer que tinham comprado o terreno do Verdelago e queriam falar comigo”, recorda Gabriela Iglésias, referindo o sócio de Luís Filipe Vieira.
A partir daí o projeto, que até então tinha andado a passo de caracol nos corredores da burocracia, começa a saltar de gabinete em gabinete. Mas antes serviu de veículo num esquema de burla qualificada, falsificação de documentos e branqueamento de capitais, acusou o Ministério Público.
O Ministério Público estava absolutamente convencido que Luís Filipe Vieira agira como testa de ferro de José de Oliveira Costa, presidente do BPN.
O Ministério Público, que construiu um processo com milhares de páginas, consultado pela SIC e pelo Setenta e Quatro, descobriu na Parvalorem, empresa que ficou a gerir os ativos tóxicos do BPN depois de este ter sido nacionalizado, uma dívida de 17 milhões associada à Inland.
O Ministério Público estava absolutamente convencido que Luís Filipe Vieira agira como testa de ferro de José de Oliveira Costa, presidente do BPN. Tudo se passou entre o final de 2003 e meados de 2004.
O presidente do BPN terá aberto a porta a que a Inland, de Vieira, usasse uma empresa de fachada – Transibérica – para comprar ações da Sociedade Lusa de Negócios (SLN), que Oliveira Costa queria controlar.
Nesse esquema, o BPN concedeu um crédito à Transibérica para financiar, entre outras empresas, a compra de ações da Verdelago. Ao mesmo tempo, a Transibérica e a Inland firmaram um contrato de compra e venda, em que a última vendia ações da Sociedade Lusa de Negócios. No entanto, nunca houve nenhuma compra das ações da Verdelago e essa verba teve outro destino: foi usado para comprar ações da SLN.
Almerindo Duarte, sócio de Luís Filipe Vieira, foi o arquiteto de todo o esquema, suspeita o Ministério Público. Luís Filipe Vieira e o sócio foram acusados pelo Ministério Público, porém, a procuradora responsável pelo processo arquiva-o em 2021, entendendo existir uma “dúvida razoável” relativamente à participação de Vieira na alegada burla.
Voltando ao Algarve. No dia 14 de outubro de 2003, cinco meses após um estudo de impacte ambiental realizado pela Almargem que lembrava que “um resort deste tipo não tem obrigatoriamente que estar em cima da praia”, o ministério das Cidades, Ordenamento Território e Ambiente emite uma declaração de impacte ambiental favorável à edificação do projeto. Quem assina por baixo é José Eduardo Martins, secretário de Estado do Ambiente na altura.
“Não fazia a mínima ideia de quem era o dono”, diz-nos o hoje comentador político. “Fui secretário de Estado durante três anos. Assinei centenas de declarações de impacte ambiental.”
“Estamos a falar de uma época em que falávamos muito pouco nas alterações climáticas e a problemática da subida do nível do mar”, diz-nos, por sua vez, Luís Brás, acrescentando outras críticas: “No fundo, o projeto compromete o único troço livre que ainda existe naquela área porque já está ocupada com outros empreendimentos.”
Com a luz verde sinalizada pelo parecer favorável, o processo move-se como água: Almerindo Duarte agenda reuniões com José Estevens em fevereiro de 2004; em abril, um despacho conjunto dos Ministérios da Economia e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente reafirma o interesse público do projeto; em julho, a revisão do Plano de Pormenor é aprovada em sessão de câmara; em agosto, a revisão do Plano de Pormenor é aprovada na Assembleia Municipal; em janeiro de 2005, o projeto de loteamento é entregue na câmara para aprovação; em julho, José Estevens anunciava o projeto com pompa e circunstância; em fevereiro de 2006, o projeto é declarado PIN (Projeto de Interesse Nacional); e em junho é totalmente aprovado.
“Provavelmente, ele sabia que eu era do Sporting”, confidencia o antigo presidente da Câmara de Castro Marim.
“Não o fizeram sem que tivessem que percorrer todos os caminhos que havia a percorrer em termos administrativos. Não foram levantadas barreiras”, diz José Estevens. “Encontrei-me duas ou três vezes com Luís Filipe Vieira”, continua o antigo autarca, garantindo que Luís Filipe Vieira nunca o convidou para uma partida de futebol. “Provavelmente, ele sabia que eu era do Sporting”, confidencia, revelando: “Convidou-me para ir ao casamento do filho. Não tive a oportunidade de ir.”
Estava dado o tiro de partida para se construir em cima da Praia Verde um campo de golfe de 18 buracos. Além de um hotel de cinco estrelas, com 197 quartos recheados de luxo, um aldeamento turístico, completados com restaurantes e lojas, uma piscina interior, um centro de congressos com 1800 metros quadrados, várias piscinas exteriores, um spa e um ginásio. O Verdelago Beach & Golf Resort estava em marcha, pronto para invadir a pública beach front de 1,5 quilómetros da Praia Verde.
A construção do empreendimento é inaugurada com acusações de crime ambiental, com a empresa de Luís Filipe Vieira a abater 90 sobreiros e outras espécies protegidas. Algo que foi repetido em 2008, que mereceu uma queixa da Almargem.
“Havia um pequeno povoamento de sobreiros. Já havia um estudo de impacte ambiental e os especialistas diziam que os impactos não eram de tal ordem que fossem suscetíveis de poder comprometer o empreendimento”, defende-se José Estevens.
“Não conheço” o abate de sobreiros ocorrido nesta altura, respondeu-nos Filomena Sintra, que acompanhou o projeto de Luís Filipe Vieira desde o berço, ainda hoje vice-presidente de Castro Marim.
A ser negociado desde 2006, a 20 de fevereiro de 2008 o projeto Verdelago recebe um financiamento tripartido entre o BES, a Caixa Geral de Depósitos e o Millennium BCP: cerca de 270 milhões de euros. Da parte do BES, eram 78,5 milhões de euros.
Os bancos faziam fé numa febre turística a invadir o concelho de Castro Marim, projetando um valor comercial total de 375,279 milhões de euros. Mas o sonho dissipou-se num ápice.
Com a crise do subprime a chegar do outro lado do Atlântico o projeto fica em águas de bacalhau. A braços com uma grande reestruturação do grupo Promovalor, empresa recentemente criada que destrona a Inland como a mãe que gere o império imobiliário de Luís Filipe Vieira, o projeto é adiado apenas um ano após a aprovação do financiamento de 270 milhões.
“Em 2008, quando começou a crise, começaram com muitas desculpas. Pediam-me mudanças, porque o contrato dizia que era só com a aprovação do cliente”, recorda Gabriela Iglésias, que se foi mantendo no projeto por lhe ser “fiel”, “apesar das demoras no pagamento”. “No ano de 2009 começaram algumas atitudes que mostraram uma mudança. Começou a haver desculpas para planos traçados, que o banco os controlava muito.”
Ainda assim, o alvará de loteamento do projeto foi aprovado e foi assinado um contrato de gestão do empreendimento por parte do Starwood Hotels & Resorts – o grupo que detém os hotéis Sheraton – em 2010. A Câmara Municipal de Castro Marim, depois, deu uma mãozinha para o empreendimento não ir por água abaixo.
“O projeto foi todo aprovado em termos de alvarás, licenciamentos, em 2010. Depois foi suspenso com mútuo acordo entre o promotor e o município, dando-se início a uma alteração do Plano de Pormenor”, afirma-nos Filomena Sintra.
Passados três anos o projeto mal tinha brotado do catálogo. Para desatar o nó e fazer rejuvenescer o resort, o grupo de Luís Filipe Vieira meteu o futebol à mistura.
Um documento de junho de 2013 do Espírito Santo Investment Bank, comandado por José Maria Ricciardi, revela-nos que a Promovalor estava em conversações com o Grupo Doyen, cujos negócios obscuros da subsidiária Doyen Sports foram revelados com estrondo pelo denunciante Rui Pinto. Era para investir em Verdelago.
Nascida em Malta e presidida pelo português Nélio Lucas até 2017, a Doyen Sports chegou a ter na sua carteira estrelas como David Beckham e Neymar, e especializava-se na Third Party Ownership, um regime de copropriedade de passes de jogadores. Não teve pudor em abrir os cordões à bolsa e investiu mais de 100 milhões de euros neste tipo negócios, até a FIFA colocar um ponto final neste regime, em 2015.
Gianni Ifantino, presidente do órgão máximo do futebol mundial, apelidou este sistema de “escravatura moderna”. Diz-me que com quem andas e dir-te-ei quem és, ensina-nos o provérbio.
A forma de entrada do Doyen no empreendimento Verdelago estava a ser negociada nesta altura. O que interessava era que o grupo despejasse os seus milhões do gás natural cazaque: fosse através da aquisição de 50% dos direitos do projeto, fosse através da compra 50% do terreno ou desenvolvendo o empreendimento lado a lado com a Promovalor, desde 2007 a cabeça do império imobiliário do grupo. Foi, ainda, considerada a possibilidade de a Sembol, empresa de construção da Doyen, construir o resort.
No dia 11 de novembro de 2013, o banco de investimento liderado por José Maria Ricciardi realiza um novo ponto de situação sobre o Grupo Promovalor. Neste documento já se contempla um atraso de dois anos na conclusão do empreendimento Verdelago e que a Promovalor estava na mesa das negociações com um novo investidor, além da Doyen: o grupo alemão MPC, cuja venda de dois submarinos ao Estado português foi investigada pela justiça.
Nesta análise, o BESI lançava uma premonição: “estima-se que seja necessária dívida adicional no montante de 95 milhões de euros”.
Mais tarde, na ressaca da entrada do novo ano, a 3 de janeiro de 2014, Nélio Lucas tenta aliciar os administradores do BES próximos de Luís Filipe Vieira, entre um deles Amílcar Morais Pires, convidando-os para uma festa de arromba.
Lamentando não se terem visto mais depois de terem estado em casa do administrador da Doyen Sports em Londres, garante que os administradores vão “adorar”. E avisa: Almerindo Duarte e Luís Filipe Vieira também estarão presentes.
Nélio Lucas, de seguida, dá um toque ao sócio de Luís Filipe Vieira, Almerindo Duarte, reencaminhando-lhe o email: “Para teu conhecimento”.
Almerindo, qual acorrentado pela banca, como haviam dito a Gabriel Iglésias, assegura ao Amílcar Morais Pires que o relacionamento deles é sem compromissos, para não se sentir obrigado a estar presente na festa de Lucas. Mas lança um isco: “quem sabe”, não estarão todos os investidores da Doyen, porventura importantes para futuros negócios.
Esta festa ocorreu numa igreja do século XIX, na zona de Mayfair, Londres. Custou 195 mil euros, que Nélio Lucas pagou através de uma conta sua no Lichtenstein, segundo o jornal digital de investigação The Black Sea.
Chegamos ao dia 28 de maio de 2014, pouco mais de dois meses antes da resolução do BES.
Quase simultaneamente, a cúpula do BES reúne-se, incluindo Ricardo Salgado. Á mesa da Comissão Executiva, Daniel Santos, do Departamento de Acompanhamento de Empresas, apresenta uma proposta de aquisição de 100% dos créditos pelo Fundo Aquarius, gerido pela Oxycapital.
Com um aparte: o fundo só seria criado no dia 30 de junho de 2014. Com a dívida alastrada, e enfarta, por três bancos – incluindo garantias bancárias, eram 89,4 milhões de euros entre, BCP, Caixa Geral de Depósitos e BES – a criação do Fundo Aquarius foi o engenho inventado para retirar as dívidas do balanço destas instituições. E a preço de saldo, pois fundo o ficaria com os créditos por 73 milhões de euros, um desconto de 12%.
Na verdade, são dois apartes: apesar de o fundo comprar 100% do financiamento, Luís Filipe Vieira ficaria com 25% do capital social da empresa Verdelago. E como indicava a premonição do BESI no documento de novembro de 2013, o BES estava pronto para largar, neste negócio, mais 65 milhões de euros para finalmente erguer o hotel de luxo, as suas townhouses e afins. Ficaria, assim, o “chefe” do sindicato bancário, financiando cerca de 60% do empreendimento.
Nesta célebre reunião da Comissão Executiva, Ricardo Salgado estava presente mas não assinou a aprovação desta operação no Conselho Diário de Crédito.
Com o desmoronar do grupo do clã Espírito Santo, a venda dos créditos ao fundo foi adiada, sendo concretizada apenas em fevereiro de 2015, já sob a alçada do Novo Banco. Os termos são mantidos, exceto o financiamento adicional de 65 milhões. O fundo nega que lhe tenha sido feito um desconto na aquisição dos créditos.
“O Fundo Aquarius adquiriu, em 2015, os créditos detidos por todas as instituições financeiras sobre a Sociedade Verdelago, não tendo sido concedido nenhum desconto, perdão de dívida ou redução da taxa de juro à sociedade”, respondeu-nos por escrito o Verdelago Resort.
Joaquim Goes, administrador do BES, foi trabalhar para a Oxycapital, em novembro de 2015, e é hoje administrador da Verdelago. Goes não nos quis dar uma entrevista. “Nenhuma negociação relativa à aquisição dos créditos da Sociedade Verdelago, S.A., teve a participação de Joaquim Goes no âmbito das suas funções anteriores ou atualmente exercidas”, diz-nos a equipa de comunicação da Verdelago.
Quanto ao papel de Vieira, a Verdelago afirma que, “com a aquisição da Sociedade pelo Fundo, Luís Filipe Vieira deixou de exercer qualquer controlo sobre a Verdelago – Sociedade Imobiliária, S.A., não influenciando os destinos da empresa, tendo nela mantido apenas uma mera participação minoritária através da empresa Inland”.
No entanto, Vítor Seixas, gestor de projetos da Promovalor desde 2011, enviou no dia 28 de março de 2017 um email a Luís Filipe Vieira com a revisão do business plan do projeto Verdelago. Vítor Seixas não aceitou falar connosco, dizendo que as suas funções na Promovalor são meramente técnicas.
E apesar de um curto afastamento, Luís Filipe Vieira voltou ao cargo de presidente da administração da empresa em 2019, tendo lá permanecido até este ano.
Desde que entrou no saco do Fundo Aquarius, o empreendimento Verdelago acelerou a fundo na mudança de imagem. Passados 14 anos do abate dos sobreiros, o resort detido pelo fundo de capital de risco agora quer ser o pulmão de Castro Marim, plantando uma árvore por “cada cama turística”, celebrando os dias da Biodiversidade e trocando o campo de golfe por uma aposta na “harmonia com a natureza”.
“O projeto, neste momento, está a ser vendido com um projeto mais verde que deixa de fora algumas componentes que tinha algum impacto nos ecossistemas. Curiosamente, essas são zonas que têm menos valor”, sintetiza Luís Brás. “Estamos a falar de um projeto que segue a onda que muitos projetos vêm seguindo no Algarve, que tentam passar uma imagem mais verde, na lógica da sustentabilidade”, diz, acrescentando: “Quando, ao mesmo tempo, esse projeto tem impacto nos ecossistemas, creio que chamar ecológico a projetos destes é um pouco abusivo.”
Ao visitar o resort Verdelago, salta à vista a possibilidade de o empreendimento criar uma espécie de área exclusiva para privados, apoderando-se da praia pública.
“O território é um todo, serve todos”, declara a vice-presidente de Castro Marim. “A Câmara Municipal tem que purgar pelos interesses públicos.”
Uma das contrapartidas para o promotor poder desenvolver o projeto passou pela construção de um passadiço. Ao visitarmos o local, depois de termos entrevistado a vice-presidente, deparámo-nos com uma corda a vedar o acesso a uma parte pública do passadiço: “Entrada Proibida”.
Avisámos a vice-presidente, que nos disse prontamente que aquilo não podia acontecer – garantiu-nos que falaria com os promotores para retirarem a fita e permitirem o acesso.
Voltámos um mês depois. A corda mantinha-se. Só que agora dizia: “Passadiço em construção. Sem saída”.
A SIC recebeu um numeroso conjunto de documentos – mais de 1000 – sobre as empresas de Vieira e a sua relação com o BES e integrou o Setenta e Quatro numa equipa de investigação. Esta reportagem é publicada nesse contexto.
Com Pedro Coelho, grande repórter SIC. Esta reportagem teve a colaboração de Maria Rodrigues, Rita Murtinho, Pedro Sousa Coelho e Diana Matias (SIC).
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