Doutora em Estudos Portugueses - Ciências Sociais e Comunicação. Investigadora, docente e consultora. As suas áreas de trabalho são a Igualdade de Género, Igualdade de Oportunidades, Não-discriminação e Combate ao Racismo e à Xenofobia. 

A cultura da corrupção

Os fundos da "bazuca europeia" estão a chegar. Portugal tem agora uma excelente oportunidade para rever procedimentos e práticas de prevenção e combate à corrupção. Monitorizar, fiscalizar, avaliar e reorientar devem ser as palavras de ordem. 

Ensaio
14 Abril 2022

Existe uma “cultura da corrupção”? Existe. Existe e quando falamos de “corrupção” estamos a falar de interações, relações e transações entre seres humanos dotados de vontade e discernimento. Daí que seja na organização social que encontramos a sua emergência, o seu fundamento ontológico e o seu processamento cognitivo e psicossocial. Mas, para que este fenómeno se manifeste, é necessário que os seus fatores de controle o permitam, que a expectativa dos seus agentes de origem e de destino seja considerada “socialmente aceitável”.

A expressão “corrupção” tem um âmbito alargado e abrangente: dos tráficos de influência de dimensão relacional quotidiana ao tráfico de influência de grandes empresas que integram interesses económico-políticos não assumidos. Os protagonistas são acionistas, proprietários, bancários, políticos, empresários, espiões administrativo-políticos-industriais-empresariais-informáticos-informadores, hackers e mercenários.

De facto, o risco de preferência (a defesa de interesses próprios ou de terceiros, suscetíveis de serem objeto de suborno e/ou chantagem) é o recurso não sofisticado e adaptado das velhas práticas sociais assentes no interconhecimento. Do ponto de vista antropológico, podemos dizer que a prática subsistente a todo o processo assenta em dois conceitos culturalmente associados: “favor” e “troca”.

Dependemos de quem nos lê. Contribui aqui. 

A representação cultural da prestação de um “favor” implica uma “troca”, como se fosse uma “caução”, para a prática de uma ética da reciprocidade capaz de garantir a igualdade de tratamento, supostamente inerente ao funcionamento do sistema socio-relacional institucional.

O “direito de preferência” continua juridicamente vigente. Na ética popular da sociedade tradicional (sujeita à estratificação social ditada pela propriedade da terra), o princípio da “gratificação” é uma regra de comportamento. A sua origem próxima reside na expressão de apreço por um acto sobre o qual se exerce uma representação cultural que justifica a necessidade da sua manifestação pública. A gratidão como virtude e o recurso à regra informal da reciprocidade significam uma “intimidade” e uma “cumplicidade”.

O seu juízo depende sempre da consciência da importância da “ajuda” e das suas variantes contextuais (solidariedade, agrado, exercício do poder e criação de dependências). Mas também, e não em poucos casos, do medo: o medo da retaliação, da penalização, da vingança, da vendetta, da cobrança desse favor ou da “desonra”.

Uma lógica assaz distante da que se vive nos movimentos das bolsas, ao estarem implicados níveis de corrupção cumulativos e exponenciais que elevam ad absurdum o jogo algorítmico, que por sua vez legitima e dissimula os crimes subjacentes a determinada prática, a determinada cultura organizacional. Disso são testemunho os exemplos (seguramente menos de uma quinta parte da realidade) dos montantes envolvidos que surgem como “escandalosos” e/ou “imorais” ao coletivo formado pela opinião pública que os tende a interpretar como “casos pontuais” ou “fuga de informação”. Fraudes, subornos, falsificações, duplicações de faturação e sobrefaturação, branqueamento de capitais, crimes fiscais “em carrossel” são classificados pelo reconhecimento da sua regularidade. São apresentados com o início de frase “mais um”…

Na realidade, se o processo democrático permitiu, por um lado, que os mecanismos socio-institucionais adquirissem uma importância cultural significativa no comportamento social, por outro lado, o Estado Social não se sentiu (auto)coagido à sua profunda remodelação. Não reforçou o seu poder de fiscalização e verificação das Medidas de Prevenção da Corrupção nem da Prevenção e Gestão de Riscos de Corrupção. Não o fez no exercício institucional, empresarial, público e privado português.

Dada a insuficiência de recursos do Estado nesta matéria (e por a sua aplicabilidade entrar em contradição com a prática social ditada pelo costume), a sociedade portuguesa não atingiu o estado de modernidade que implica a confiança no Estado e nos procedimentos produzidos no âmbito de uma cultura tecnológica informatizada e digital. O facto seria facilmente remediável se os procedimentos profissionais fossem adequados, rápidos e eficazes.

Mas uma cultura que recorre a princípios de seleção e recrutamento com base no interconhecimento e na troca de favores, relativizando o papel das redes de parentesco no controle político e social do próprio Estado, é uma cultura assente numa estrutura organizacional do tipo rural. Num contexto societário distinto (urbano), esta estrutura funcionará por uma espécie de “auto-ilusão”, erro de “paralaxe”, “projeção” ou, mais que isso, por desajuste inclusivo ou desadaptação, de um estado de “anomia identitária”?

Fraudes, subornos, falsificações, branqueamento de capitais, crimes fiscais “em carrossel” são classificados pelo reconhecimento da sua regularidade. São apresentados com o início de frase “mais um".

Na verdade, o problema da persistência na atuação remete sempre para o mesmo fenómeno: estes procedimentos e os valores que lhe subjazem contribuem para a imagem de uma representação social negligenciadora, susceptível de influenciar o discernimento dos cidadãos. A grande realidade que devemos, antes de mais, enfrentar e assumir (ao invés de o negarmos, escudados no eventual equívoco de que essa realidade advém de uma prática “longuínqua” própria de elites) é que o objeto do juízo subjacente a matérias como a da “corrupção” constitui um fenómeno novo.

A urgência de regulação é reconhecida consensualmente como imperativa pelos mecanismos do exercício do poder. Não, não se trata de um fenómeno novo, mas sim de uma representação social nova relativa à teia relacional dos cidadãos e à sua interferência nos procedimentos mais irrelevantes do funcionamento do Estado e das empresas.

A natureza das relações humanas presenciais e verbais permite e garante o anonimato e a confidencialidade. A informalidade das práticas socialmente aceitáveis, gerida tecnologicamente, pode conduzir (sem detrimento de todas as vantagens locais que contenham potencialmente) à reprodução das práticas que muitas vezes estão já revogadas juridicamente. Por exemplo, a “talhe de foice” é uma das situações em que se verifica que a realidade caminha de forma muito mais lenta que o pensamento e a sua expressão.

Na Índia, as castas foram legalmente abolidas, mas todas as relações sociais são processadas partindo e atendendo à sua existência. As sociedades produzem, nas relações sociais horizontais, reflexos das relações sociais verticais na medida em que a “vontade de poder” de cada interveniente emerge e procura nos “pares” de referência os símbolos identitários para se legitimar.

Os crimes de corrupção organizados podem aparentar informalidade relacional ou formalidade vinculativa. Regra geral, a formalidade vinculativa oculta a relacional e, assim, de um almoço de trabalho ou de cortesia pode-se acabar – conforme o caminho trilhado, da disponibilidade, da vulnerabilidade, da ambição e da determinação – num crime de corrupção. Tudo depende do(s) caminho(s), dos aliados, dos objetivos e dos meios definidos para serem alcançados.

Neste sentido, o que está em causa é o controle dos meios a cujo acesso responde a densidade da procura de ascensão social. Ou, dito de outro modo, a problemática das elites e das massas – que pode implicar a prática da corrupção, feita através de práticas informais marcadas pela cumplicidade e pela entreajuda, mesmo quando se trata de um caso de associação criminosa.

Numa cultura cujas representações mentais se demonstram permissivas relativamente à avaliação da realidade contemporânea, os desempenhos dos corruptores ativos e passivos são mais facilmente percecionados como não-criminosos, não-intencionais ou dignos de suspeição (tal como quando a exibição de riqueza exterior é perspetivada popularmente como “sorte”, resultado de “esperteza” ou sinal de que a “aldrabice” compensa). Constata-se que o grau de tolerância sobre o que consideramos más-práticas é particularmente singular, uma vez que é diferente do permitido pelo estrito rigor da observância da lei, dos mecanismos e procedimentos que regulam as relações entre os cidadãos e o Estado.

Não é frequente encontrar, na orgânica de instituições ou de empresas, gabinetes de auditoria interna. Porquê? Quem usufrui de vantagens decorrentes da ineficácia do sistema? Combater a corrupção não é fácil. Mas combater a fraude e prevenir a corrupção não é difícil.

A este propósito registe-se a necessidade urgente do Estado Social investir, no quadro da responsabilidade do exercício do interesse público, numa maior transparência processual, de acompanhamento dinâmico e assertivo da concorrência e do reconhecimento dos conflitos de interesses. Isto para, uma vez alterada a metodologia, alcançar resultados de um trabalho de gestão imparcial, justo e equitativo. O facilitismo não favorece e até contraria o desenvolvimento de competências diversificadas pela população: afunila o número e o tipo de pessoas de que se rodeia a elite dos diversos poderes, contribuindo para a reprodução de redes de interesses vários.

Para travar os resultados deste jogo desproporcional que impede a distribuição de grande parte da riqueza que é de todos, as entidades gestoras do aparelho institucional financeiro e económico produziram legislação em vigor nos Estados-membro da União Europeia, logo também em Portugal, sobre como gerir esta matéria em entidades públicas e privadas.

A adaptação da sociedade portuguesa aos novos paradigmas e premissas, deve, para mitigar efeitos recorrentes, ser objeto da reflexão e intervenção do Estado Social. Deve fazê-lo agora, quando já correram quatro anos desde a integração do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) no sistema jurídico português.

Na verdade, no que à corrupção diz respeito, não se trata de desconhecimento, omissão ou “vazio” legal. As práticas que fundamentam a origem de suspeitas e cuja execução denota vulnerabilidade por exposição a decisões humanas (individuais) estão identificadas e são suscetíveis de controle e de uma gestão monitorizada em função de uma check-list de procedimentos a verificar.

Quando falamos em corrupção e nos confrontamos com práticas criminosas que extravasam o seu domínio, temos necessidade de as classificar por nos permitirem identificar situações de risco de corrupção – conflitos de interesses, tráfico de influências, concertação de resultados, tratamento preferencial, não segregação de funções, subornos, negligência e abuso do poder. E por isso dispomos de uma série de medidas de prevenção e/ou de mitigação que é preciso pôr em prática, executar, monitorizar, ajustar, avaliar, acompanhar, verificar e fiscalizar regularmente.

Em Portugal, não é frequente encontrar na orgânica de instituições e/ou de grandes, médias ou pequenas empresas, gabinetes de auditoria interna ou outras expressões de medidas de controle interno, efetivo, profissional e objetivo. Porquê? Quem usufrui de vantagens decorrentes da ineficácia, da falta de controlo interno e de rigor do sistema? Combater a corrupção não é fácil. Mas combater a fraude e prevenir a corrupção não é difícil.

Apesar da dificuldade da previsão de todos os atos individuais cujas decisões envolvam situações que indiciam e materializam atos e práticas de corrupção, certo é que dispomos de instrumentos para ter em conta esta possibilidade com um grau de eficácia significativo. Destaco, a título de exemplo, os Planos de Gestão de Riscos e Prevenção da Corrupção - sem detrimento dos esclarecimentos jurídicos de instâncias como o Tribunal de Contas. O problema não é, por isso, a complexidade da matéria ou sequer a dificuldade de dispôr de meios para lhe dar resposta.

A corrupção resulta do défice democrático das sociedades ocidentais, nas quais a “transparência” foi substituída por uma burocracia que, opaca e dispersa, permite um maior grau de ocultação e de dissimulação dos objetivos e dos indícios de práticas individuais ou de grupo.

A ideologia feudal não desapareceu. As relações de proteção e alianças existem e reconstroem-se quando a carência de trabalho e de poder económico impõem necessidades a que o sistema não responde.

A corrupção resulta de um deficitário sistema de controle e verificação de procedimentos e práticas no que respeita à ação humana e decorre de uma organização societária onde a ostentação da “troca de favores” tem, culturalmente, uma conotação positiva e um uso corrente

A Corrupção perverte as relações humanas e limita as liberdades individuais. Com exceção dos casos particulares de desvio de verbas ou de utilização particular de bens públicos, a maior parte das práticas de corrupção ativa e passiva começa por recorrer à ancestralidade lógica do procedimento “favor-troca” e dos seus frutos. Complexifica-as em redes de anonimato dos tratamentos administrativo, contabilístico, jurídico e burocrático que assustam e afastam os cidadãos. Mudámos os meios, mas continuámos a geri-los com os mesmos conhecimentos, e isso produz necessariamente assimetrias, desajustes e insucessos.  

Optar pela corrupção como meio facilitador para contornar as dificuldades é um itinerário fácil e seguro. Tem um preço, é certo: a dependência, o elo histórico de articulação entre elites e a característica mais evidente da organização social portuguesa. A ideologia feudal não desapareceu. As relações de proteção e alianças existem e reconstroem-se quando a carência de trabalho e de poder económico impõem necessidades a que o sistema não responde.

A Corrupção resulta, por isso, de um deficitário sistema de controle e verificação de procedimentos e práticas no que respeita à ação humana e decorre de uma organização societária onde a ostentação da “troca de favores” tem, culturalmente, uma conotação positiva e um uso corrente, informal, longe da classificação pejorativa do termo interpretada pelos seus agentes como “suborno” (pagamento pelo risco) ou “compensação” (retribuição pelo resultado). Neste contexto, a falta de informação (ou “informação truncada” intencionalmente) dificulta a avaliação e o juízo colectivos sobre o fundamento estrutural e corrente da prática da corrupção.

Pretende-se que o ato de corrupção seja um ato sem História, sem passado, servindo o presente e comprometendo, muitas vezes, a ideia de futuro. Os próprios envolvidos o defendem como um ato de exceção à regra - e nessa medida respondem convictos que são inocentes das acusações de corrupção. A corrupção vai desde a valorização da atitude denunciante do trabalhador até à aprovação de projectos de dimensão vária e transversal: da entrega de “luvas”, para se acelerar o “despacho” de um dado processo, até à assinatura de contratos entre entidades com tratamento preferencial, ao desprezo pelo conflito de interesses (proporcionando associações familiares, corporativas ou lóbis) e à negligência relativa a indícios de tráfico de influências.

Tudo o resto são crimes organizados, não se resumem a atos ou a práticas, mas a uma orgânica previamente elaborada com vista a alcançar-se uma finalidade. No entanto, o facto é que as pessoas se reconhecem em procedimentos que não problematizam, não rejeitam a atitude em si: de corromper e de aceitar ser corrompido.

O que indigna e deixa os cidadãos indignados são os montantes e as competências (vistas como estratégias que implicam conhecimento e aplicação orientada e intencional de procedimentos) dos envolvidos nos casos que a comunicação social veicula sobre os chamados “crimes de colarinho branco”. Grande parte das pessoas identifica estes casos com o exercício da política de “dois pesos e duas medidas” e a legitimação incontornável da violação do direito à igualdade de tratamento (onde se integra a dificuldade de acesso a uma Justiça célere, atempada e útil).

Contudo, a mecanização dos procedimentos públicos e privados, administrativos ou empresariais, assumiu, na arquitetura da União Europeia, a necessidade de regular e homogeneizar a interatividade interinstitucional informática. E, desta forma, obrigou à conformidade com o RGPD, que preserva a privacidade e protege a circulação dos dados pessoais. Terá a sociedade portuguesa e a sua Administração Pública compreendido a extensão de um tal diploma? Reconhece-lhe a devida e induscutível validade? Aplica-o? Acompanha a sua criação e a sua aplicação? Avalia? Retifica? Reajusta? Aperfeiçoa a eficiência e a eficácia do controlo?

Criar e Desenvolver uma Cultura de Prevenção e Gestão de Riscos na Administração Pública, nos Serviços, no Mercado Empresarial e na Educação é uma realidade a que não podemos escapar. Isto se queremos reduzir os custos da adaptação social à mudança societária que atravessamos desde que há 39 anos aderimos à atual União Europeia. As alterações económicas, sociais, educativas, financeiras e tecnológicas foram tantas e processaram-se de forma tão imperativa que foi, inequivocamente, insuficiente para efeitos de reconversão socioeconómica e administrativa-política. Foram décadas de adaptação à vivência sob os princípios decorrentes dos Tratados num país que procurou (sempre que a conjuntura política nacional o permitiu) manter, consolidar e reforçar o Estado Social, preventivo e assistencialista.

Desenvolver, a partir do próprio sistema educativo e formativo, a ideia da responsabilidade social, é promover a confiança num aparelho institucional útil e funcional que dispense o recurso a mecanismos menos lícitos contrários aos princípios da transparência e da subsidiariedade. A lei existe, está em vigor e obriga todas as entidades públicas e privadas a criar planos de Prevenção da Corrupção e Gestão de Riscos. Existem? Estão atualizados? Com que frequência? Os trabalhadores têm conhecimento dessa avaliação?

O Estado Social carece de um funcionamento transversal e participado que é urgente definir, planear e executar. E os cidadãos devem exigir aos políticos competência, eficácia e eficiência dos serviços para que a inutilidade do recurso à corrupção seja cada vez mais visível.

A realidade é que não existe praticamente nenhuma fiscalização - excepto, regra geral, por motivo de denúncia. O mesmo acontece com a Legislação de Proteção de Dados que praticamente ninguém cumpre. Ninguém conhece, ninguém pratica, todos relativizam, ignoram, negligenciam. Contudo, o cumprimento dessas normas e procedimentos permitiria uma capacidade de acompanhamento e monitorização de todas as atividades, salvaguardando “imprevistos”, “esquecimentos” “lapsos” e “erros” e interceptando atempadamente procedimentos suspeitos de incorrerem nas figuras que temos vindo a referir: favorecimento, influência, subornos… ou seja, corrupção.

O Estado Social carece de um funcionamento transversal e participado que é urgente definir, planear e executar. E os cidadãos devem exigir aos políticos competência, eficácia e eficiência dos serviços para que a inutilidade do recurso à corrupção seja cada vez mais visível e aumentem os resultados da identificação de procedimentos que dificultem, evitem e impeçam práticas administrativas indissociáveis destes processos.

Finalmente, cumpre dizer que muito do que percecionamos como corrupção é, mais do que desejariamos, fruto do crime organizado. A corrupção é o meio para concretizar o crime. A corrupção não é causa nem é objetivo: é recurso de operacionalização do crime, da fraude. O seu espaço de ação é o processamento entre a intenção e o cumprimento do objetivo, é neste processo que se torna possível identificar suspeitas de procedimentos que devem ser verificados/auditados.

Em Portugal, a fraude é confundida com a corrupção e não com o crime organizado, apesar de a fraude ser o indício mais forte a induzir a necessidade de investigação.  Não prevenir a corrupção e não combater a fraude aguardando a sua denúncia é impróprio de um Estado Democrático. É que a questão também passa pela retórica jurídica que explora a terminologia aprovada e plasmada nos diplomas legais cujo objetivo é garantir a plasticidade para efeitos de adaptação a casos particulares.

Esta possibilidade retórica e argumentativa abre portas e janelas para a interpretação judicial dos casos de “corrupção”, de “colarinho branco”, de “crime organizado” e de “associação criminosa”. Em tempos próximos da aplicação do pacote de fundos comunitários conhecido por “bazuca europeia”, Portugal tem agora uma excelente oportunidade para rever procedimentos e práticas, para assegurar aos cidadãos que é possível confiar no Estado Social e na orgânica da nossa sociedade. Monitorizar, verificar, confirmar, avaliar e reorientar.  Eis as palavras-chave para uma cultura de rigor própria de um Estado de Direito.